Capítulo 2

Capítulo II
         
          Demorou alguns momentos para se lembrar de onde estava e de tudo que tinha acontecido. O lugar estava silencioso e praticamente escuro, exceto por uma fraca luz amarela que emanava de um cristal pendurado ao teto. Pelo que ele podia ver, parecia que se encontrava em uma espécie de caverna artificial, já que o teto e as paredes eram praticamente planos, como se alguém tivesse esculpido uma casa na pedra bruta.
         Ainda se sentia fraco e dolorido, mas mesmo assim fez um esforço e levantou-se. O quarto não tinha moveis, a não ser um colchão de palha e uma pequena mesa ao seu lado. Não havia porta, apenas uma abertura que levava a um curto corredor.
         Ouviu um leve tilintar metálico vindo de algum lugar mais a frente. Alarmado, seguiu furtivamente pelo corredor, tentando não fazer barulho. Viu várias portas pelo corredor, mas não se importou com elas e continuou seguindo em direção a uma luminosidade que se mostrava pela fresta de uma porta no fim do corredor.
Com o máximo de cuidado, entreabriu a porta e espiou o que estava

acontecendo lá. Pela abertura ele pode ver o que parecia ser uma cozinha, com uma pequena mesa no centro e vários armários pelas paredes. Diante do que parecia o fogão estava a jovem que ele vira mais cedo, ocupada preparando alguma coisa.

Aliviado, ele abriu a porta e entrou na cozinha. Ela percebeu o movimento e virou-se para falar com ele:

--Finalmente você acordou. Sente-se, já estou terminando de fazer o desjejum. –disse enquanto voltava a mexer no fogão.

--Muito obrigado por tudo – disse enquanto sentava – Não sei como agradecer por ter me salvado.

--Tenho certeza de que você encontrará um meio de retribuir. Poderia começar me dizendo o seu nome, que tal?

--Desculpa, ainda estou um pouco desnorteado. Eu sou Drake Hollster – e estendeu a mão para ela.

Ela retribuiu o cumprimento e completou

--Eu sou Lissa. Sabe, é muito difícil alguém aparecer por aqui, ainda mais um guerreiro nas condições em que você se encontrava. Como chegou até aqui?

--Isso é uma longa historia, e pode demorar um pouco.

--Sem problemas – e colocou duas tigelas com uma espécie de mingau dentro --temos tempo de sobra aqui.

Ele olhou o mingau com um ar desconfiado, mas o cheiro estava muito convidativo e, além do mais, já fazia muito tempo desde que ele tinha comido algo.
--Não se preocupe – disse a moça rindo, percebendo o ar de desconfiança do rapaz – isso é apenas mingau de aveia, pode comer sossegado – e comeu uma colherada da tigela dele.
Enquanto comiam, Drake contou sobre a batalha na aldeia e sobre o lobisomem branco que o atacou.
--Isso é realmente impressionante, aquele bando de lobisomens estava causando um bom estrago por estas bandas.
 --Tivemos grandes perdas nessa batalha, e provavelmente eles acham que estou morto agora. –ele estava muito sério – Preciso voltar o mais rápido possível para meu batalhão.

-- Eu te entendo, mas isso não vai ser possível agora. Não parece, mas lá fora está caindo uma nevasca terrível.
-- Sério? Afinal, onde estamos?

–Bem, você se lembra daquele pinheiro em que você estava encostado, não se lembra? – Drake confirmou com a cabeça – Então, agora nós estamos exatamente embaixo dele.

–O que? Acho que não entendi direito. Você quer dizer que estamos realmente embaixo daquela árvore? Isso é o que, algum tipo de bruxaria?
–Não, pelo que eu sei essa era uma caverna natural. De qualquer forma existem algumas coisas que eu gostaria de explicar.
– Sem problemas, quem sabe assim eu conheço um pouco mais da minha salvadora.
–A sim, vai conhecer sim – Ela levantou e colocou os pratos em uma bacia com água— Espero que você não tenha nenhum problema com magia, pois isso seria péssimo.
–Claro que não, já tive diversos magos sob minhas ordens o campo de batalha, eles são realmente muito úteis.
– Nisso concordamos – disse ela, sorrindo. –Bom deixe me contar a minha história.
Ela sentou – se e começou a falar.
– Magia é tudo para mim, acho que eu sempre tive facilidade em lidar com os elementos da natureza.  Eu comecei meu treinamento bem cedo, quando ainda era muito pequena. Meu mestre é como um pai para mim.
–Quando eu era criança eu queria me tornar um mago, mas eu não tinha o dom. O que você sabe fazer?
–Eu sei fazer muitas coisas. Poções, fórmulas defensivas, ofensivas, magias para confundir as pessoas e muitas mais. –ela soou orgulhosa, muito orgulhosa.  Preste atenção– ela estendeu a mão e no centro da palma brilhava um fogo pálido, quase sem vida. Tremeluziu por um pouco, e então começou a ficar azulado e a aumentar de tamanho, quase maior do que a mão da jovem. O fogo tomou a forma de um pequeno dragão e começou a bater as asas como se quisesse voar para longe de sua criadora. Drake olhava tudo aquilo maravilhado, sem palavras para descrever o que viu.
Ela fechou a mão e o pequeno dragão de fogo azul desapareceu.
–Eu passei a vida toda estudando, mas mesmo assim ainda não sei nem uma fração do que meu mestre sabe.
–E onde está o seu mestre agora?
–Longe, mas acho que ele não vai demorar. Meu treinamento ainda não terminou, e ele já saiu em viagem a mais de um mês.
–Nossa, e o que ele vai dizer se me encontrar aqui?
– Provavelmente nada. Eu sou perfeitamente capaz de me defender sozinha, e você não parece mal intencionado.
        – Eu nunca te faria mal, você me salvou da morte certa. Eu te devo uma, mocinha.
        – Um dia você vai poder me retribuir, tenho certeza. Se você me der licença, tenho muitos afazeres por aqui. No corredor que vai para o quarto você vai ver uma porta com uma coruja entalhada. Lá é a biblioteca. Meu mestre possui muitos manuscritos raros sobre os mais variados assuntos. –ela levantou-se e começou a guardava os pratos – Fique a vontade para ler o que quiser, mas tome o cuidado de não danificar nada. Mais tarde eu vou ver como você está.
        Drake ainda ficou sentado por um tempo depois que Lissa saiu, refletindo sobre os últimos acontecimentos. Ela parecia ser realmente muito poderosa, e também muito boa, já que o salvou quando poderia muito bem ter deixado-o morrer de frio. Ele sabia que não poderia ficar por muito tempo, apesar de aquele ser um lugar muito acolhedor. De qualquer forma ele ainda teria de esperar mais um tempo até poder partir, então decidiu dar uma olhada na biblioteca.
        A porta da biblioteca era feita de uma madeira negra, com um detalhado entalhe na forma de coruja ocupando toda a parte superior. Bastou um leve empurrão para que a porta abrisse suavemente, sem fazer nenhum barulho. A sala estava escura, mas assim que Drake entrou, um brilhante cristal branco começou a brilhar, iluminando todo o ambiente, revelando uma sala completamente diferente da esperada.
        Drake imaginou que a biblioteca seria um tanto pequena, com menos que uma dúzia de estantes, visto que estavam em uma caverna. Também esperava que a iluminação fosse fraca e amarelada, assim como a do quarto. A biblioteca que estava diante de si humilharia a coleção de qualquer nobre, por mais rico que fosse.
        A sala era enorme, e devia conter mais de cem estantes. O ambiente era completamente iluminado por uma luz branca, forte o suficiente para uma leitura agradável. No centro da sala havia uma grande mesa de pedra, rodeada por várias cadeiras acolchoadas. Próximo à mesa estava um pedestal, onde se encontrava um grosso livro de capa preta, que devia ter mais de mil folhas.
        Drake se aproximou e examinou o livro, que parecia muito antigo. Não havia titulo na capa, mas assim que o abriu descobriu a sua finalidade. Era um catálogo, com o nome de todos os livros dali. Estranhou o fato de não haver marcações referentes à localização, mas mesmo assim começou a folhear o livro.
        O livro estava divido por assuntos, então não foi difícil para ele encontrar o tema que mais gostava: dragões. Livros sobre essas fantásticas criaturas eram relativamente difíceis de encontrar, mas naquela biblioteca estavam reunidos cerca de dez exemplares. Correu o dedo pela lista e achou um titulo que lhe chamou a atenção: Vida e Morte: verdades e mitos sobre Dragões.
        “Como eu faço para encontrar esse livro?”— questionou Drake, visivelmente confuso – “Vou demorar anos pra achar ele dentre todos os que estão aqui”.
        Quando desviou o olhar do livro, percebeu que haviam pequenas setas azuis  piscando no teto, apontando para frente e, em seguida, fazendo uma curva pelas prateleiras. Ele tinha certeza de que não estavam lá antes, então começou a seguir na direção indicada.

        Caminhou por um tempo interminável, no qual pode observar que ali estavam livros dos mais variados assuntos: Geologia, botânica, história, animais raros e muitas coisas mais. A trilha acabava indicando uma estante, na qual estava o livro procurado. Assim que ele pegou o livro, as setas inveteram as posições e se tornaram vermelhas, facilitando a volta.
               Drake passou o resto da manhã no quarto, lendo o livro. Sua anfitriã parecia muito atarefada, de modo que preferiu não ir incomodá-la. Quando estava chegando a hora do almoço, ela foi chamá-lo para avisar que seu mestre chegaria de viagem em pouco tempo.